segunda-feira, 11 de abril de 2011

Amanda, 1983

Sentada e esperando uma resposta, você força lembrar se ligou pedindo pra que tomasse cuidado e não aceitasse nada de estranhos. Revestido de branco, ele sai da sala grande de paredes verdes-claro com as sobrancelhas bem retas. O ar de quem tinha tudo nas mãos e sente que falhou, mesmo fazendo até onde o diploma licencia. O striptease de luvas cirúrgicas anuncia o fechamento do show e o começo dos dias em que olharemos no espelho sem a coragem necessária pra se intitular humanos.

Aqueles olhos tímidos, que você frequentemente confundia com cinismo, não vão abrir amanhã, nem quando o sol bater no queixo contraído pedindo com jeito. O jornal não veio pra transformar isso em manchete. E, pra quem sempre sonhou voar, o pulo mais alto de todos foi também a notícia mais triste. Pra quem sempre brigou pelas vezes que voltou tarde, agora, depois da última festa, parece que tudo aconteceu cedo demais. Se ficar mais confortável, pense assim: ela simplesmente se mandou, como costumava ameaçar.

É preciso ser forte diante da fraqueza de quem só queria sacudir o mundo. Caminhar nas nuvens é o último escape de quem não tem paciência de ficar por baixo, esperando pra ver o arco-íris que, mais dia ou menos dia, todos dizem chegar depois da tormenta. Algumas pessoas simplesmente não conhecem a palavra luta, desaprendem a sorrir ou então não encontram um jeito de esquecer. Pra quem sempre precisou de atenção, o escuro do quarto muitas vezes não é suficiente. Se pudéssemos julgar, não tínhamos ficado pra aprender.

Eu sei, a saudade é só um prêmio de consolação. Mas como não reconhecer a importância de um sentimento que dura mais que a presença? Até onde vocês nos ensinaram, o amor acaba e se divorcia. Já a saudade nunca tem fim. O jeito dela caminhar pela rua, olhando pros três lados, folheando livros em estandes comerciais, fingindo que alguém gostava dela do outro lado da vitrine, convencida de que a ausência de afeto era tão bonita quanto na literatura. Aqueles olhos já doentes de arrependimento pelas coisas que já sabia, não teria audácia de viver. Viu só? Muitas lembranças vão ficar, além de, claro, todo ano, esse maldito dia e esse maldito mês.

Mas ela pode estar sorrindo pra você agora mesmo. Ué, por que não? Vai que agora, onde estiver, achou um outro alguém dizendo que também se sente um pouco perdido. E que oferece mais oportunidades de conversar que um bilhete curto na geladeira. E que vai além da primeira tentativa, confronta a primeira recusa, com a ponta dos dedos levanta aquele mesmo queixo contraído querendo saber o que foi dessa vez, menina. Alguém que sabe iluminar um dia frio sem aquela velha luz tão amarela e artificial. E diz, meio baixinho e quase sem convicção, sussurrando o nome bonito e sugestivo que você deu, que amar não é assim tão complicado. Basta fazer a diferença.

Talvez não tenha dado tempo dela dizer, mãe, mas você foi e sempre será o maior exemplo. Faça jus, seguindo em frente como não teve tempo de mostrá-la como se faz. Correria, sei bem como é. Talvez a gente não a encontre novamente e essa noite fria vá negaciar eternamente o gosto de uma segunda chance. Não importa aonde ela sempre estará, de qual lugar misterioso ela vai te sorrir, pra quem for capaz de carregá-la no peito e no pensamento, todo lugar é aqui.

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