segunda-feira, 12 de março de 2012

Posse


Ocupo todos os cantos da cama para deixá-los fora do meu mundo. É o meu modo de esconder que na verdade eu só queria perder o cobertor para pés maiores que os meus. Dormir sozinha dá aquelas sensação de que o frio existe mesmo quando o termômetro marca 30 graus, de que os travesseiros são insuficientes e o espaço é infinito. Por dentro e por fora.

Ocupo todos os segundos do meu dia pra não deixá-los tomarem posse da solidão que cultivo como companheira. Sou dela, não tem jeito. Sou minha e não sei me dividir. Essa é só a maneira que eu aprendi a ser, porque pertencer aos outros faz doer.

Já aceitei vocês e suas cargas, suas faltas; e nada disso foi suficiente porque vocês não puderam ou não souberam me aceitar. Vocês não podem carregar o que tem aqui dentro, esse peso que eu preciso dividir pra não ficar sobrecarregada por existir. Agora não aceito mais. Não consigo aceitar nada pela metade e vocês são incompletos porque não se permitem ir além.

Não posso aceitar e dormir sozinha é quase um protesto. Não aceito. Não deixo mais ninguém me roubar de mim.

segunda-feira, 5 de março de 2012

Aqui Dentro

Eu sempre tive recaídas, mas sempre respeitei o tempo das coisas na minha vida. Até por hoje, continuo aceitando o trajeto, sem desistir. Mas faz tempo que as coisas não fluem naturalmente. Faz tempo que eu não me encanto, e isso é chato. Talvez por que eu não me encante pelo que realmente desejaria. Mas ainda assim, nada anda me tocando muito. Nem ao corpo e nem a alma. Nem a cabeça e muito menos ao coração.

Eu resolvi subir tão alto, que agora fica difícil de alguém me alcançar. Eu quis o “melhor lugar”, distante de tudo e de todos, que ficou quase impossível alguém conseguir chegar aqui. Aqui é diferente, é prático, é distante, é frio, mas é frio porque eu gosto do frio, é frio porque quando chegar alguém é pra esquentar de vez. E enquanto não há ninguém capaz, eu não quero queimar nada aqui dentro de mim. Em vão. Deixa assim. Frio.

E o grande problema está aí, não há ninguém. Todos estão do lado de fora, não há ninguém definitivamente aqui dentro. Não consigo achar se é que existe, “solução” para estas coisas. Eu acredito que acontece. Que a gente não vê, que é espontâneo. E acredito porque já vivi, já senti, e muitos por aí provavelmente também já se depararam, simplesmente apaixonados. Aqui só residem lembranças passadas de pessoas que já foram um dia. E que se são lembradas demais hoje, é por falta de lembranças recentes. É por falta de gente. Gente competente!

Aqui dentro, segunda, terça, quarta, e quinta eu tenho muito que fazer. Muitos planos, muitas tarefas, muitos deveres, muitas preocupações, e tempo pra pensar nessas coisas não há. Lazer, é respirar; sorrir, um segundo se quer no meio da confusão do dia-a-dia.

Mas passou das 18 horas da sexta-feira, tudo muda. Outra pessoa passa a explorar todo esse corpo e alma, e eu entro numa crise de abstinência completamente irreconhecível. De longe parece TPM, mas raramente é.
É uma saudade. Uma falta... Uma falta de sentir falta, uma melancolia, uma tristeza de não ter ninguém aqui dentro, compartilhando do mesmo calor; mesmo ar (Olha isso? O mesmo ar!)...
Ninguém aqui dentro pra me ensinar a rir de outras coisas, que não seja as que eu já estou acostumada. Ninguém pra me mostrar uma banda nova, e uma música com a minha cara. Um novo livro; ou uma nova vida. Um novo ritmo, outros lugares. Uma viagem, onde ninguém nos conheça.

Eu vejo mil e um caras aqui dentro. Imagino cada um, em cada canto daqui e como se sairiam por aqui. Penso, fico rindo sozinha. Penso, imagino, dou gargalhadas. Seria engraçado, ver alguém aqui dentro. Logo aqui? O meu lugar, quase ninguém pisa, quase ninguém suporta o peso. As minhas bagagens sempre ocupam espaço demais, e então quem chega não vê espaço pra ficar. Não vê motivos, também. Que pena!

Seria engraçado ver alguém tentando se adequar aqui dentro. Minhas regras, meus estresses, meus cantos, minhas crises, meus humores. Seria sem graça na verdade. Por isso preciso me encantar. Me apaixonar. E só assim dará “certo”. Alguém que consiga me subestimar sem saber. Alguém que mexa com meu psicológico e com meu coração, roubando total a cena aqui dentro. Chegando com as bagagens sem pedir licença, e sem deixar espaço nem para um nécessaire minha. Tomando conta. De tudo aqui dentro.
Pra ele? De uma vez só. Pra mim? Muito aos pouquinhos. Tão pouquinhos que não se percebe.
Eu venho tentando acertar. De duas uma, ou eu estou presa aqui dentro de uma forma que eu não sei como fui parar, ou as pessoas estão preferindo amor ao ar livre. E eu não sei lidar com este.

É complicado demais, estar no lugar certo, na hora certa, no dia certo, na fase certa, no momento ideal. Isso acontece sim, mas é raro demais pra mim, na minha concepção. Vão dizer que não tem esse negócio de hora certa e lugar certo e blá blá. Mas se não isso, então a outra opção é aquela velha história que eu creio desde o início. ACONTECE. Simples e objetivo... Pra uns.

E se “acontece” não há o que fazer. Então eu escrevo, e penso, e fico rindo sozinha, e imagino, e finjo que gosto de longe pra não machucar ninguém. Brinco, danço, bebo, e não me comprometo. Ainda não chegou a minha hora. E faço amigos, hoje eu prefiro fazer amigos, mesmo que isso demore ou quase não funcione muitas vezes. Eu ainda prefiro assim. Cansei de “fazer” paixões, que hoje eu desconheço por aí. Criar afinidades estúpidas, pessoas sem chão pra pisar. E que quando pisa e vê que não tem nada, leva todo mundo pro buraco.

Já trouxe muita gente aqui para dentro que cagou na entrada e na saída também. Que entrou aqui de chinelo, e eu boba que sou não exigi que os tirasse. Conclusão, mal eu sabia que a pessoa estava com os pés todos sujos, e quando resolveu sair, fez questão de sujar tudo aqui dentro. Escondeu-se em cima de um chinelo limpo e bonito. E quando bem quis saiu pela porta da frente. Logo aqui dentro, que eu tinha demorado tanto pra renovar, limpar, e adornar, e arrumar, e enfim enfeitar, perfumar, celebrar. Ah não! Foi uma única lambança para nunca mais! Ou nem tão cedo! Faxina aqui dentro? Só das minhas próprias sujeiras. Sujeira dos outros aqui dentro eu não admito mais! Eu que não vou ficar limpando o que as pessoas fazem de errado na minha vida. Ou elas aprendem a viver decentemente, ou elas não pisam aqui.

Porque se eu não cuidar daqui. Quem vai cuidar? Ainda não apareceu o companheiro mor, que vai me ajudar a sustentar a carga, a sacudir a poeira quando for preciso, lavar tapete, botar cortina, arrumar a cama, fazer comida. Esse ainda não me ocorreu. Então, vou eu mesma tomando conta sozinha disso aqui. Isso aqui é precioso, é a única coisa que eu tenho. Que é meu de verdade. É meu espaço, é a minha vida.

Hoje já é segunda, e já estou mudando. Minha pele da alma já está mudando (risos). Estou a caminho de esquecer essa história que escrevi. De esquecer quem foi que escreveu. Mas no fundo, quando eu lê, vou reconhecer lá de longe... Quando for chegando a sexta-feira a noite novamente. E aí a outra parte de mim volta, e ela sim, irá entender com todo o sentido este texto.