terça-feira, 17 de setembro de 2013

Talvez já saiba quem sou

Quando nos perguntam, do que mais temos medo, a maioria das pessoas responde: Da morte. Pois é, há um tempo atrás eu responderia exatamente isso. Mas hoje não, a partir de hoje não mais. A morte é clara, morreu acabou, então o que nos leva pensar no agora, no presente, no que ainda podemos mudar e vivenciar, demonstrar, fazer. Pensar no que já foi feito, em toda a trajetória que te faz chegar até onde está. É aquela velha pergunta, e se você morresse agora estaria satisfeito? Para alguns é fácil responder, para outros nem tanto, para uns é fácil modificar de hoje para amanhã. Para outros é a coisa mais difícil do mundo, e não porque não querem, mas por terem muitas outras coisas sobrecarregadas sobre si, muitas coisas vinculadas que infelizmente não dependem só ou mais da pessoa, ou que ainda se prendem ou se agarram a nós. Quando tudo que estava ao seu alcance já foi feito, onde mudar? Eu não tenho medo da morte, eu tenho é medo de morrer infeliz, triste. Medo de morrer sem ter me sentido realizada na vida, por algum motivo. E daí se eu não morrer velhinha, saudável, feliz, inteira como nos comerciais da TV? E se eu não conseguir ver meus netos, bisnetos? Isso é superável, isso não apavora, porque isso é normal, a cada dia que passa morrem-se mais pessoas jovens, acontece. Eu poderia morrer aos vinte e tantos, mas se eu já tivesse conseguido metade ou o comecinho do que eu "planejo" para a minha felicidade, para a minha tão desejada "realização", se eu encontrasse durante essa curta vida no máximo 3 pessoas verdadeiras, que me olhassem com olhares sinceros, e que eu sentisse exatamente o que elas me passassem, já estaria bom. Bom demais. 


Eu temeria não ter conseguido ter meus filhos, sim. Temeria não ter conseguido criar pessoas boas, sim. Temeria não ter formado a MINHA família, sim. Temeria não ter dado netos aos meus pais, sim. Temeria não comemorar os trinta, sim. Temeria muitas coisas, porque todo dia é um novo dia, e se pode viver coisas inacreditáveis, sei e sabemos disso. Mas talvez eu não conseguisse segurar toda a barra de ter tudo isso, talvez eu não sobreviveria. Então seria ótimo ter tudo isso, quero ter tudo isso, mas quero estar pronta para tudo isso, não quero chegar nem muito depois e nem muito antes. Mas quero chegar! Porém se eu não chegar, quero pelo menos terminar feliz, realizada com o que pude fazer da minha vida, até onde pude chegar. Não quero viver em vão, eu tenho medo é disso. De não valer, de não significar para mim a minha própria existência. 

Quando somos filhos de um "sobrevivente" que sofreu pra nascer e sobreviver, de alguém muito forte, de alguém muito durão e que segurou e segura as pontas de ser assim, acabam por nos rotular assim também, é bem quase que: "Ih, olha ali a ciclana, sabe de quem ela é filha? Do fulano, é do fulano!". Pensam, que só porque somos filhos herdamos tudo, e aí vão nos criando assim, agüentamos tudo, somos crianças grandes, ouvimos tudo, sabemos de tudo, até opinamos as vezes. Qualquer machucado, qualquer choro, qualquer desentendimento, ouvimos "Você é forte, agüenta firme!", muitas crianças são mesmo fortes e permanecem fortes até crescer e assim vão. Outras não, outras só acreditam que são fortes sem saber realmente se são mesmo ou não, sustentam a mentira dos adultos para que talvez, digo talvez, seja mais fácil para eles. Acho que me encaixo na segunda opção, sempre agüentei firme tantas coisas, sem medir se era suportável aquela carga toda ou não, eu simplesmente agüentava. Cresci e fui me moldando, criando minha personalidade e pronto, dei de cara com cargas maiores, em grande quantidade, tudo ás vezes de uma vez só. Parava e pensava inúmeras vezes "Sou realmente forte ou não? Ou só estou acostumada a ser forte e não pensar na minha sobrecarga? Sou forte ou isso foi o que me fizeram tornar? Talvez essa não seja eu." E acho que não era mesmo, é difícil encarar uma realidade que você acreditou ser sua durante anos, que você lutou achando ser você, que você agüentou porque achava que era obrigada a agüentar por ser assim desde pequena, porque todos sempre esperariam de você no mínimo isso, agüentar. 

E então pude tirar disso tudo que muitas vezes, na maioria quiçá, eu sou o oposto do que parece, do que demonstro, do que fui muitos anos, do que as pessoas enxergam. Ninguém me conhece, nem meus pais, por sempre me rotularem fortes demais, nem eles. Eu definitivamente não sou tão forte. Posso ser em alguns momentos e isso levar a crer que sou assim, mas não sou. Não sou tão fria quanto parece. Sou fraca, sou sensível, sou dramática, sou profunda, levo a sério, levo a ferro e fogo as coisas importantes, as coisas boas. Sou fria quando deveria ser quente, e sou quente quando deveria ser fria. Queria que as coisas e as pessoas não me atingissem da forma que me atingem, mas me atingem e eu não me vejo fazendo muita coisa quanto a isso porque eu sou assim, essa sou eu. Queria muito que, as coisas que acontecem na família não me afetasse, que a falta de humanidade das pessoas não me afetasse, que as falsas amigas, que as falsas amizades não me afetasse, que falsos amores não me afetasse, que distantes e falsos parentes não me afetasse, que o vizinho que não sabe o que fala mais fala, não me afetasse. Porém afeta, e não há como fugir muito disso, a gente vive além disso claro, mas afeta da mesma forma. E não é que tudo afete, mas sim as coisas essenciais da vida, que não se compra, que não se vende, que não se paga, que não se negocia. Por tanto tempo nada afetou, que agora juntou, aglomerou, e tudo cai no colo de uma vez só. Essas coisas que eram para ser coisas espontâneas, sem custo. Mas que hoje não são mais. Hoje tudo é dinheiro, ou um rostinho bonito, e isso não consegue entrar na minha cabeça. Tudo se perdeu e está todo mundo a mercê ou se rendendo a essa perdição sem fim, sem propósito algum. Ninguém quer chegar a lugar nenhum. Poucos querem, quase nada. E alguns desistem, se entregam, "Ah já está tudo perdido mesmo, não tem jeito!". 

Até os vinte e alguma coisa gente jura para os nossos pais, que temos amigos de verdade, que aquele cara ou aquela mulher sabe aquele(a)? Ele(a) gosta da gente sim, e que o chefe é legal é nosso amigo nos entende, e que se amanhã ou depois acontecer alguma coisa com eles (nossos pais), os parentes estarão aqui. É, lendo assim parece bem normal, cabível, o correto. Mas não é bem assim, e um dia cada um no seu tempo, as pessoas irão entender um pouco disso. Que ter amigos é a coisa mais rara do mundo, que ás vezes só achamos que temos mesmo. Que o cara ou aquela mulher, nem gostava tanto da gente assim, passou. Ou que a gente nem gostava tanto dele(a) assim. Que o chefe? Ah esse, se amanhã ou depois aparecer outro funcionário melhor, não importa quão gente boa ele seja, ele vai te mandar embora sem dó. E que os parentes, é esses são os que talvez nos agüentem por mais tempo, porém com o passar dos anos, os anos e o mundo mudam e eles também. Nem todos os parentes são iguais, uns vão te carregar pro resto da vida, porém outros vão rezar pra te ver longe o quanto antes. 

Lógico, que para tudo isso que citei, existem exceções. E amém por isso! Amo as exceções! Mas por o mundo está tão perdido, que as exceções também estão, perdidas por aí. Quem consegue achar, agarre! Aproveite, porque todo mundo anda buscando suas exceções boas da vida. Ainda procuro a exceção da minha vida, em todos esses sentidos. Ainda procuro por algo que me faça pensar que valeu a pena. Seja um trabalho, um novo lugar para morar, uma experiência diferente de vida, uma pessoa para partilhar a vida, ou quiçá duas pessoas (risos). Pois até hoje de todas que conheci com nenhuma senti que estava a caminho, quiçá realizada. Não sei o que de fato virar primeiro e fará me sentir realizada realmente, e não importa a ordem, eu só quero sentir que estou a caminho. De algumas realizações não estou tão longe, se assim posso dizer. De outras só Deus saberá. 

Não queira ser alguém ruim, perverso, chato demais. Alguém que não durma com a consciência limpa, alguém que machuque demais, alguém que passe por cima de tudo e de todos, alguém que não pense em como o outro pode está. Não esqueçam das pessoas boas, preservem elas. Não durma sem resolver o que se pode resolver, sem falar o que se pode falar, não seja igual ao mundo, porque o mundo anda podre, quer se podre também? Pense nisso! 

É difícil ter que largar tudo, e entender que você é completamente diferente do que pensou ser durante toda a sua vida. Mas o primeiro passo, é aceitar quem você é de verdade, e viver você, e não uma suposta personagem, "forte". Porque na hora da morte, nada disso é importante. O que mais importa o que mais é questionado, e o que mais nos preocupa e nos faz pensar na vida, é "Eu fui feliz? Valeu a pena?", e é só isso. Ser forte já não adianta muita coisa. Então não tenhamos medo da morte não, só tenhamos medo de morrermos infelizes, tristes, insatisfeitos com o que é de essencial na vida. 

Marcella Rios