terça-feira, 7 de dezembro de 2010

. Romance em pó .

Toda vez que perco a paciência com o ser humano, lembro daquela noite. Você brincando de passar a marcha no câmbio, e depois a mão nas minhas pernas, e depois gritando uma do Cazuza e ameaçando meio doido chegar até a praia pra ver o mar às seis da manhã e então voltar pra casa. Você tinha os olhos loucos pelo mundo, pelas minhas pernas naquele vestido de verão e meus pés descalços no painel. Como nessa época do ano eu dou pra odiar todo mundo, tenho pensado muito em ti.

Espero que um dia eu possa te ver de novo. Até talvez explicar dialeticamente o que eu sempre quis dizer com ter medo de ter medo de ter medo, coisa que você nunca entendeu ao certo. Homens. Você não dava conta de tudo que saía da minha boca e tampouco se esforçava. Medo só sente quem tem coragem, quem arrisca, quem se dá. E eu, do alto do meu salto quinze, a única altura que meus nervos femininos conseguiam suportar, sempre fui a antítese de tudo que deseja uma mulher. Em tese.

Naquela primavera que eu te queria tanto e não encontrava um jeito avassalador de dizer, eu daria minha vida por você, pois igual minha vida não valia muita coisa - você bem pôde ver nas noites e noites me assistindo dançar em tantas outras bocas que não a sua. É que amor, sabe, sei lá. O que vou fazer se quando você sentava do meu lado e ficava em silêncio, fitando lá longe, onde ia nosso encontro por acaso, eu só conseguia ver horizontes e nenhuma fronteira? Acho que amor é tipo um esporte radical, quem não pratica morre de medo, se sente incapaz e todo aquele salto impossível repetir.

E você, exatamente você e seu jeito de me balançar sorrindo com piadas bobas, era o tipo de distração que minha vida não precisava. Eu não era garota de sorrir com piadas bobas, aliás, eu não era garota de sorrir, muito menos de gostar de alguém que sai na rua de calça jeans, havaianas branca e barba de anos, nem aí pra ninguém e a cara suja e louca por todo mundo. E você seria o homem perfeito não fosse sua combinação charmosamente bizarra de calça jeans, havaianas branca e barba de anos.

Nunca gostei de sonhar e crer em pessoas, por isso o auê naquela madrugada que você me forçou descer até a praia e me beijou tímido, sem pedir nada em troca, e me fez ser uma dessas que gostam de caras tímidos que levam garotas pra ver o mar. Droga, viu? Da minha ilha emancipada, cercada de sombra e mar revolto, vem você, invade, e faz um país. Não foi uma luta justa, eu lá me esforçando pra ser mulher e você estala os dedos, puxa meu queixo e me faz menina tudo outra vez. E até hoje você atrasa minha vida trazendo à tona essa visão meiga que faz salivar em reuniões corporativas presididas por fortes concorrentes ao prêmio Top Ser Humano Idiota de 2010.

Hoje eu vivo naquele mesmo tempo que não te conhecia. O mundo era chato e ninguém usava calça jeans, havaianas de R$ 7,90 e barba por fazer desde o fim da guerra fria. Um mundo abandonado sem alguém com os olhos loucos por ele. E nem por mim e minha mania de não sentar no banco do carona com modos de menina. Mas confesso, morri de medo quando você decidiu que adorava o perfume de baunilha da minha cama e da saudade estúpida e irracional que eu sentia sempre que me abandonava pra alimentar seu vício de coca-cola com bastante gelo. Não pude aguentar. Radical. Demais pra mim. Se começo a me sentir cheia, transbordo, explodo, viro a página, corro e só paro se me sinto vazia outra vez.

Lembra? Eu disse que amor não era questão de azar ou sorte, mas de habilidade, coisa que nunca fui muito expert. Você bem disse que amor que nunca acontece não vira pó, vira poesia. Então cá estou, lembrando você transbordando do mundo quando comia com os olhos meus pés no painel e pensando que você seria mesmo o homem perfeito sem aquele chinelo horroroso, mais a calça e a barba. Também, se não for, vou continuar sendo assim, chegada em romances curtos e instantâneos que me atrasam para sempre.

Minha História

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