sábado, 28 de janeiro de 2012

Meu tipo de garota


Eu não tenho carro e sei que isso soa conspiratório contra minha masculinidade, mas normalmente me saio bem. Moro na área central e os primeiros encontros costumam acontecer na área central. Primeiros encontros não envolvem montanhas, vinhos e fogueiras, apenas cinemas, parques, cafeterias, museus, bares noturnos e pistas de boliche, de modo que para as investigações iniciais, o centro é uma zona perfeitamente funcional.

Não ter carro há partes ruins, há partes boas. Partes boas: sem trocas de pneu, você pode circular pela rua gratuitamente, sem acidentes de trânsito, ainda não há flanelinhas dando palpite na sua maneira de sentar em algum banco público da praça. Partes ruins: diversas, especialmente quando o tipo de garota que você escolheu pra sair não combina com ciclovias. Não sou de convenções ou machismos, mas eu posso explicar, eu acho: alguém precisa ser largado em casa, certo?

E quando é o rapaz quem paga impostos rodoviários, todos sabem como acontece - ele pisa no freio, desliga o carro e espera. 1) Se ela estiver a fim, vai convidá-lo pra um café. Se ele também estiver (vai estar, eu sei que vai), já estará no portão. 2) Se ela não estiver no clima, dirá que convidaria pra um café, mas a tia Emília está dormindo no sofá porque veio de Arroio Grande fazer uns exames e montes de outros pretextos (mas todos sabemos que o motivo real é que você confessou ligar pra sua mãe todos os dias). Bem, já está tudo ensaiado. É assim que deve ser. Não há danos maiores.

Nos atrapalhamos, nos meus casos pelo menos, quando é ela quem desliga os farois. Ela quer subir, você também quer (você sempre quer, eu sei). Mas garotas não dizem "posso subir e tomar um café?" ou "posso usar seu banheiro?" Garotas não bebem café à noite, a não ser garotas-escritoras com prazo vencido; garotas não usam banheiros dos seus futuros maridos no primeiro encontro pois admitem a hipótese do vaso sanitário entupir e isso pode fazer o casamento ir por água abaixo, ao contrário da descarga.

O que eu faço nesses casos? Simples. Dou a impressão de ser debilóide. Ela desligou o carro, apagou os farois. Ela quer, não quer? Eu acho que sim. Ela acha que eu acho que sim. Eu acho que ela acha que eu acho que sim. Ela acha... (enfim, você entendeu). Aí chega o momento em que a rua começa a ficar perigosa e eu tenho de perguntar. Isso é o brabo. Ela pode ser meio tontinha e dizer que não bebe café depois das dez e só se tocar que café não era café já em casa, como aconteceu com George Costanza naquele episódio onde ele precisa trocar o cassete da secretária eletrônica da namorada.

E perguntando a coisa há o risco dela presumir que eu penso que ela é esse tipo de garota, e me dizer não-sou-esse-tipo-de-garota-que-você-está-pensando. Quando o tipo de garota que estou pensando é o tipo de garota agradável, boa de conversar, que eu adoraria conhecer melhor, servir um chá de camomila para o caso dela não ser uma escritora em estado de procrastinação, e ir até uns beijos no meu sofá novo, comprado especialmente para confortar garotas do tipo - o meu tipo, o tipo interessante, independente do tipo. Nunca sei de que porra de tipo de garota ela está falando.

Só que não sou bom com transmissões de pensamento, assim ao vivo. Sou um cara de bons canais, de ótima programação, sem muita propaganda e, baseado no horário nobre do encontro, já deu pra sacar que tenho audiência razoável. No entanto é como se no meio do vendaval eu precisasse subir no telhado e ajustar minha antena pra ela compreender que aquele sofá combina bem com o tipo de filme que vamos assistir. Aí parece que perdi meu controle-remoto, quando vejo estou fazendo uma novela e tudo que ela entende são ruídos e chuviscos. Nessa parte eu já escorreguei e caí do telhado.

A verdade é que essa coisa de one-night-stands não é bem comigo. Não porque faço o gênero romântico; ou porque não saio com o tipo de garota que curte essas noites de amor isoladas; ou por não julgar aprazível a ideia de dormir com um semi-desconhecido que pode muito bem ter um pentagrama tatuado entre os seios. Gosto dos riscos. É que hoje em dia organizar um primeiro encontro é tão comum quanto noites de cometa, e você não vai querer estragar tudo fazendo sexo dentro dele.

Sei lá, há montes de regras ou talvez seja fricote demais pra minha idade. Talvez seja aconselhável fazer algum exame de DNA pra saber onde foram parar meus cromossomos Y. Ou, quem sabe, eu revoluciono o sistema de namoros testando a possibilidade de dar uns amassos na carona da minha bicicleta. Ou faço o óbvio e dou um jeito de me automobilizar. Mas, na boa, eu até compraria um carro, se já não soubesse que o problema não é motor ou o tipo de garota. E sim, eu. Só que aí eu precisaria de um recall materno e não é bem pra esse tipo de útero que estou tentando voltar.

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